quarta-feira, 17 de março de 2021

Governo volta atrás e imposto de importação de bicicletas terá redução de apenas 10%, saindo de 35 para 31,5%

Pressionado, Governo Federal volta atrás e imposto de importação de bicicletas terá redução de apenas 10%, saindo de 35 para 31,5%

Entenda por que alíquotas mais baixas são melhores para todos os segmentos do mercado de bicicletas

No último mês de fevereiro, o mercado de bicicletas teve uma conquista importante: o Diário Oficial da União publicou uma medida que define a volta da alíquota original do imposto de importação de bicicletas no Brasil, de 35% para 20%. Menos de um mês depois, nesta quarta (17/03) a decisão foi revogada pelo Gecex (Comitê Executivo de Gestão) da Camex (Câmara do Comércio Exterior) por pressão de senadores do Amazonas. A alíquota terá uma redução de apenas 10% sobre o número atual, saindo de 35% para 31,5%.

A Associação Brasileira do Setor de Bicicletas (Aliança Bike) considera essa decisão um retrocesso para a economia nacional. Nesta nota, a entidade aponta os motivos pelos quais se posiciona contra o cancelamento da medida que já havia sido anunciada.

NOTA AO MERCADO DE BICICLETAS

A Associação Brasileira do Setor de Bicicletas (Aliança Bike), que conta hoje com mais de 110 associados entre fabricantes e montadores, distribuidores, importadores e lojistas, é favorável a todas as medidas que ampliem o acesso de brasileiros e brasileiras a bicicletas melhores e mais baratas. Em linha com este princípio, reduzir a carga tributária do setor de bicicletas é um passo importante para tornar as bicicletas mais acessíveis à população.

Sem prejuízo aos argumentos elencados abaixo, a Aliança Bike, como é de conhecimento de todos, vem trabalhando incansavelmente pela redução de impostos de componentes que não são fabricados no Brasil, impactando positivamente toda a cadeia de montagem de bicicletas no país. Já conquistamos a redução de câmbios e cassetes e conquistaremos de 20 outros componentes, se tudo der certo.

A alíquota do imposto de importação aplicável às bicicletas inteiras é parte importante desta teia complexa de tributos e,  por este motivo, a Aliança Bike vem a público listar algumas das razões pelas quais defende a medida publicada pelo governo federal e cancelada nesta quarta-feira:

1) A alíquota normal do Imposto de Importação de bicicletas aplicável no Mercosul é de 20%. Em 2011, o Brasil inseriu as bicicletas na sua Lista de Exceções à Tarifa Externa Comum do Mercosul (LETEC) para aumentar unilateralmente esta alíquota para 35%, atendendo a um pedido de uma empresa. A inclusão de produtos na LETEC é uma medida temporária e excepcional. Ela gera distorções dentro do Mercosul. Neste caso, a diferença entre a alíquota aplicável no Brasil e nos demais países membros do bloco resultou em importações anuais de 4 milhões de bicicletas pelo Paraguai, um país que tem uma população de 7 milhões de habitantes. Ou seja, boa parte das bicicletas importadas pelo Paraguai têm o Brasil como destino de forma criminosa por meio de descaminho.

2) A alíquota de 35% atualmente aplicada pelo Brasil às bicicletas é a mais alta do mundo, sendo o limite máximo estabelecido pela OMC (Organização Mundial do Comércio) e superior à aplicada a produtos supérfluos como bebidas alcoólicas e cigarros. Mesmo 20% já é uma alíquota mais alta do que a média mundial. No quadro abaixo, ilustramos as alíquotas médias aplicáveis às bicicletas nos principais mercados do mundo e em mercados comparáveis ao brasileiro em termos de desenvolvimento econômico:

País/bloco

Tarifa média (8712.00)

China

14,4%

Estados Unidos

8%

União Europeia

14,5%

África do Sul

7,5%

Argentina

20%

Índia

20%

México

15%

Já no quadro abaixo, ilustramos as tarifas aplicáveis no Brasil a outros produtos muito menos essenciais do que a bicicleta:

Produto

NCM

Tarifa

Cerveja

2203

20%

Vinho

2204

20%

Uísque

2208.30.20

20%

Charuto

2402.10.00

20%

Cigarro

2402.20.00

20%

Cartas de jogar

9504.40.00

20%

3) Conforme demonstrado nos cálculos apresentados à CAMEX e resumidos nas tabelas abaixo, mesmo com uma alíquota de 20%, os produtores nacionais, especialmente os localizados em Manaus, continuam contando com um alta barreira tarifária e vantagens tributárias suficientes para sua proteção.

Nas duas tabelas abaixo, que já consideram a alíquota normal de 20%, assumimos que o valor da bicicleta acabada seria de R$ 230,00. No caso das bicicletas fabricadas no Brasil, consideramos que o valor das partes e peças importadas seria de R$ 100,00, o valor agregado pelas operações industriais realizadas no Brasil seria de mais R$ 100,00 e a margem de lucro do fabricante seria de R$ 30,00.

Conforme se verifica da tabela, se o preço das bicicletas antes de tributos for similar, a bicicleta produzida em Manaus chegará aos consumidores por um preço bastante inferior aos das bicicletas importadas e das produzidas em outros pontos do território nacional.

Estimativa de impostos na importação de partes e peças para industrialização ou de bicicletas acabadas para comercialização, elaboração própria

 

Empresas estabelecidas na Zona Franca de Manaus

Empresas estabelecidas em outros pontos do País, não sujeitas ao SIMPLES

Empresas estabelecidas em outros pontos do País, sujeitas ao SIMPLES

Bicicletas importadas por empresas comerciais atacadistas

NCM

8714

8714

8714

8712

Valor CIF (R$)

 

100,00

 

100,00

 

100,00

 

230,00

Imposto de Importação

1,92%

1,92

16%

16,00

16%

16,00

20%

46,00

IPI

0%

-

10%

11,60

10%

11,60

10%

27,60

PIS/COFINS-importação

0%

-

11,75%

11,75

11,75%

11,75

11,75%

27,03

ICMS-importação

0%

-

18%

30,59

18%

30,59

18%

72,58

Desembolso total

 

101,92

 

169,94

 

169,94

 

403,20

Custo de importação

 

101,92

 

116,00

 

169,94

 

303,60

Tributos recuperáveis (créditos)

 

-

 

53,94

 

 

 

99,60

 

Estimativa de impostos na venda de bicicletas pelos industriais a empresas comerciais atacadistas, elaboração própria

 

Empresas estabelecidas na Zona Franca de Manaus

Empresas estabelecidas em outros pontos do País, não sujeitas ao SIMPLES

Empresas estabelecidas em outros pontos do País, sujeitas ao SIMPLES

NCM

8712

8712

8712

Valor agregado no País

 

100,00

 

100,00

 

100,00

Custo das peças importadas somado ao valor agregado no país

 

201,92

 

216,00

 

269,94

Contrapartidas

3%

7,44

0%

-

0%

-

Margem de lucro

 

30,00

 

30,00

 

30,00

Preço de venda antes dos tributos

 

239,36

 

246,00

 

299,94

ICMS sobre a venda

0%

-

18%

60,87

4,45%

13,35

PIS/COFINS sobre a venda

3,65%

8,74

9,25%

22,76

7,66%

22,98

IPI sobre a venda

0%

-

10%

32,96

Desembolso total

 

248,10

 

362,58

 

336,26

Custo de aquisição

 

239,36

 

278,96

 

305,16

Tributos recuperáveis (créditos)

 

8,74

 

83,62

9,25%

31,10

 

O quadro acima demonstra com clareza que as vantagens tributárias das empresas do Polo Industrial de Manaus são muito significativas e que a exclusão das bicicletas da LETEC não inviabilizaria as atividades das referidas empresas, visto que as bicicletas importadas continuariam sujeitas a uma carga tributária bastante superior à aplicável às bicicleta nacionais.

4) Mesmo com uma alíquota de 20%, aplicável antes de 2011, a importação de bicicletas inteiras nunca representou uma “ameaça” para a indústria nacional. Antes da elevação da alíquota para 35%, o maior volume de importação de bicicletas inteiras foi de pouco mais de 370 mil unidades em 2011. Sendo que, no mesmo ano, o Brasil produziu 4,65 milhões de bicicletas. Ou seja, o volume de bicicletas importadas não chegou sequer a superar 8% do volume total de bicicletas produzidas no país.

5) Apesar de a alíquota do Imposto de Importação ter permanecido elevada de forma excepcional por 10 anos, a empresa que pleiteou esta medida e seus pares localizados em Manaus não se tornaram mais competitivos e  não desenvolveram tecnologia.

Em 2011, o Brasil produziu 4,65 milhões de bicicletas e em 2019 produziu 3,8 milhões, ou seja, 850 mil unidades a menos. Ainda em 2011, o Brasil exportou 3 mil bicicletas e, em 2019, foram exportadas 22 mil unidades, sendo estas exportações concentradas por produtores localizados em São Paulo (48%), Minas Gerais (26%), Santa Catarina (12%) e Paraná (11%). O Polo Industrial de Manaus não exportou nenhuma bicicleta. O PPB (Processo Produtivo Básico) de bicicletas foi afrouxado para permitir a importação dos principais componentes que exigem desenvolvimento de tecnologia.

Ou seja, se a elevação da alíquota servisse para permitir o desenvolvimento da competitividade das empresas sediadas em Manaus, elas teriam passado a exportar e a produzir componentes de alto valor agregado, aumentando significativamente o número de empregos gerados, o que não ocorreu.

6) A fake news dos empregos. Foram veiculadas informações de que a medida do governo federal iria acarretar em uma perda de mais de 4 mil empregos no Polo Industrial de Manaus (PIM). Alguns falaram até em 30 mil empregos! Entretanto, de acordo com dados da RAIS/Secretaria Especial de Previdência e Trabalho (Ministério da Economia), as empresas de bicicletas localizadas no PIM geram 1.004 empregos diretos dos 8.000 existentes na indústria de bicicletas espalhada pelo país. Apenas o Estado de SP gera 3.781 empregos diretos na atividade de indústria de bicicletas.

Não há nenhum elemento probatório que indique que o PIM demitiria as mil pessoas contratadas atualmente. Mesmo com a alíquota um pouco mais justa, o Polo de Manaus continuará importando com imposto de importação de 1,92%, continuará com isenção de IPI e de outros tributos, permanecendo com enorme vantagem competitiva sobre as demais empresas sediadas no restante do país. A alíquota excessiva de 35%, portanto, serve apenas para aumentar o lucro de algumas poucas empresas em detrimento do acesso da população a este produto essencial que é a bicicleta.

7) Ainda sobre empregos, quem se beneficiaria diretamente com bicicletas mais acessíveis à população são as lojas de bicicletas. Estas representam o setor que mais emprega no Brasil, com 15 mil empregos diretos. Ou seja, a medida publicada pelo governo federal vai gerar mais empregos, exatamente onde mais se emprega hoje.

8) Bicicletas mais baratas para o consumidor final. Esse é o principal objetivo da medida, tornar as bicicletas mais acessíveis aos brasileiros e estimular o consumo e o uso delas. Em consulta aos associados da Aliança Bike, a volta da alíquota para o patamar original de 20% representará uma redução de pelo menos 11% no preço final da bicicleta.

Faixas de consumo

Utilização

Economia sentida pelos consumidores

Classes C, D e E

Mobilidade e entregadores

Economia de R$ 110,00 em uma bike de R$ 1 mil

Classes A e B

Mobilidade, passeio e lazer

Economia de R$ 440,00 em uma bike de R$ 4 mil

Atletas e Ciclistas Amadores

Esporte e lazer

Economia de R$ 880,00 a R$ 1.650 em bikes que variam de R$ 8 mil a R$ 15 mil

Atletas e Ciclistas Profissionais

Competição

Economia de R$ 6.600,00 em bikes de R$ 60 mil.

9) Taxa de câmbio (dólar) com impacto negativo para o setor. Como se não bastasse a alíquota mais alta do mundo de 35% de imposto de importação, o mercado como um todo tem sofrido com a alta do dólar. Considerando que mais de 90% de todos os componentes de uma bicicleta são importados, a alta do dólar impacta diretamente no preço para o consumidor final, pois importadores e montadores são obrigados a repassar aos consumidores a diferença de câmbio. A volta da TEC de 35% para 20%, sua alíquota original, seria uma forma de compensar parcialmente os efeitos negativos da alta do dólar para o setor de bicicletas. Não obstante, o próprio frete marítimo, desde o início da pandemia, quintuplicou de valor, o que também tem afetado negativamente as importações.

Por todos os motivos citados, a Aliança Bike se posiciona reiteradamente a favor de toda e qualquer medida que torne o preço da bicicleta mais acessível à população brasileira.  A Aliança Bike acredita que as políticas tributárias precisam ser justas para empresas localizadas em todas as partes do Brasil.

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